terça-feira, 16 de outubro de 2007

NIEMEYER DO POVO

Com 99 anos de vida, um currículo invejável e muitas convicções políticas, um brasileiro virou personalidade de um jeito incomum. Arquiteto! E desde sempre... “Eu gostava de desenhar. Eu lembro quando eu era menino, começava a desenhar com o dedo, assim no ar, e minha mãe perguntava: “O que que você tá fazendo?” Eu dizia: Tô desenhando.” (fala de Niemeyer no documentário de Fabiano Maciel e Sacha). Esse jovem transferiu seus desenhos do ar para o papel, fez surgir arranha-céus com seu traço inconfundível. Belo Horizonte, na época , sob o governo do amigo JK, recebeu de presente algumas construções que marcaram definitivamente a paisagem da cidade.

“Quando eu fui fazer Pampulha, fui falar com o JK. E ele me disse que ia fazer um bairro novo em Belo Horizonte. Um bairro com uma igreja, com um cassino, um clube e um restaurante. Quando acabou a conversa, ele me disse: olha, eu preciso do projeto do Cassino pra amanhã. Mas eu era jovem, né? Eu tava começando, praticamente era o meu primeiro trabalho. Eu tinha que atender. Fui pro hotel e fiz, trabalhei a noite inteira e no dia seguinte compareci. E ele compreendeu que comigo ele podia correr, não é? E por isso fomos juntos... Pampulha foi o início de Brasília.” Experiente na vida e na arte que faz, o arquiteto viu algumas gerações se passarem. O reconhecimento nunca lhe faltou. Mas e aos olhos do povo, que todos os dias passam pelos obras, quem é mesmo Oscar Niemeyer?

“Ele é prefeito de Belo Horizonte?”, perguntou um jovem que caminhava na companhia da namorada, outro dia, pela lagoa da Pampulha. Assustada, eu lhe respondi: “ Não, não!!! “É o arquiteto daquelas construções, respondi, apontando para o Museu e o Cassino. Continuei caminhado pela lagoa quando vi uma jovem que, alegremente fazia algumas fotos, vestida de noivas, pelos espaços do Museu. Entrei e perguntei a ela porque havia escolhido aquele lugar para fotografar. Ela, sorridente como só, me respondeu que “todo noiva” tirava suas fotos ali. Balancei a cabeça como se entendesse a resposta e apontei para a exposição das obras de Niemeyer, que fazia pano de fundo para suas fotos, e perguntei: Você sabia que aquela exposição é comemorativa aos 100 anos do arquiteto Oscar Niemeyer? Ela, um pouco sem jeito de responder soltou: “ Que bacana homenageá-lo, é importante esta exposição, principalmente para lembrarmos quem foi Oscar Niemeyer”. Ao fim da sua fala, ela me perguntou: “Mas a quanto tempo ele morreu mesmo?” Confesso que , meio sem jeito, respondi a ela que não, ele ainda não havia morrido, ao contrário, comemorava seu centenário esse ano.

Um pouco mais a frente um garoto, adolescente chamado Lucas Cotta me respondeu com toda convicção. “Oscar Niemeyer é um arquiteto. E está sendo exibida uma exposição sobre ele no museu. Eu sei porque fui até lá com a excursão da escola.” E falou orgulhoso, como se achasse importante saber quem é Niemeyer.

O complexo arquitetônico da pampulha é uma obra popular, a mais expressiva do arquiteto aqui na capital, porém não é a única. A praça da liberdade tem em seu redor um prédio que também foi desenho por ele. Mas, qual prédio mesmo? “Aquele alí”, apontou a professora Maria Lúcia Campos. Ela conta que mora próximo a praça e todo fim de semana, durante sua caminhada, não se cansa de admirar a arquitetura sinuosa do edifício, mas nem todos causam o mesmo impacto. “ Conheço todas as obras dele em Belo Horizonte, mas o edifício JK eu não gosto muito, acho que está muito maltratado.

O edífio JK foi projetado em 1953. A inspiração para a obra nasceu dos falanstérios. Abriga cerca de 5 mil moradores nas quase 1100 unidades. Causa espanto num primeiro olhar. Para olhares mais apurados como o do corretor de imovéis Danúbio Coutinho, a arquitetura de Niemeyer serve de referência na valorização das regiões. “ Um exemplo dessa valorização é o bairro de Lourdes, que fica atras do edifício JK, um das regiões onde os imóveis são muito caros”.

De uma forma ou de outra, Oscar Niemeyer é lembrando, admirado e conhecido, mesmo que seja através da telinha. “ Não sei muito bem quem é Niemeyer, mas lembro que na minissérie JK, que passou na Globo, ele ajudou o presidente de Brasília”, disse o segurança Fabiano Arruda.

O arquiteto das curvas, das declarações polêmicas, amante da vida e dos prazeres que ela proporciona diz que a vida é um sopro. Aos 99 anos e mais de 70 de profissão, diz que está cansado de falar de arquitetura.

“Mais importante do que a arquitetura é estar pronto pra protestar e ir na rua, isso que é importante, é o sujeito se sentir bem, sentir que não é um merda, que ele tá ali pra ser útil... O sujeito tem que pensar na política, a política é importante, é própria vida, pensar na miséria, procurar colaborar e quando ele sentir que a coisa tá ruim demais e a esperança fugiu do coração dos homens, aí é a revolução.”

Conhecido ou não o que dá prazer a ele hoje...“O importante é mulher né? O resto é brincadeira.